Instituto Ethos convida Miriam Vilela para um momento de reflexão sobre os princípios da Carta da Terra e sua aplicação.
Como parte de seu processo de capacitação interna, o Instituto Ethos organizou uma conversa com o propósito de aprofundar conhecimentos acerca dos princípios da Carta da Terra. A oficina, realizada no dia 4 de agosto, na sede do Instituto Ethos, contou com a participação de Miriam Vilela, diretora-executiva da Secretaria da Carta da Terra, órgão que coordena o movimento em todo o mundo, e Cristina Moreno, coordenadora da iniciativa no Brasil.
Em formato de bate-papo, a conversa entre Miriam, Cristina e a equipe do Ethos fluiu como uma troca de experiências e aprendizados acumulados ao longo dos anos pelo movimento da Carta da Terra e pelo Instituto Ethos, integrado ao movimento de responsabilidade social empresarial. Assim, as questões debatidas foram colocadas pela própria Miriam e também por membros da equipe do Ethos, que apresentaram o trabalho em cada uma das áreas da organização, apontando dilemas e reflexões para serem discutidos pelo grupo.
A seguir, algumas das questões levantadas e as observações que se seguiram.
Como foi o processo de redação da Carta da Terra?
Miriam explica que o processo de produção do documento implicou consultas em várias partes do mundo para identificar os valores e princípios essenciais da sustentabilidade. Para ela, foi um aprendizado muito rico, na medida em que diferentes culturas e áreas do conhecimento mostraram como se relacionam com cada valor, cada princípio, e como cada palavra ou conceito foi discutido a partir dos mais diversos pontos de vista. Foi, portanto, um processo participativo, no qual as decisões, embora tomem mais tempo para serem estabelecidas, podem ser implementadas em muito menos tempo, pois os conceitos já foram incorporados durante as discussões, tendo-se atribuído um sentido para sua aplicação. Isso se torna possível a partir da resolução de um processo, descentralizado e biológico, que se reproduz pelo seu próprio sentido de existência.
Esse processo de pesquisa, que foi realizado entre 1996 e 1998, buscou referências em documentos que já refletiam os valores e princípios de sustentabilidade que deveriam estar na Carta da Terra. O documento finalizado foi lançado em 2000, com o desafio de fazer com que o conjunto de princípios apresentado não fosse adotado apenas formalmente, mas que saísse do papel para interferir na prática de organizações, empresas, universidades e indivíduos ao redor do mundo.
A Carta da Terra já foi traduzida para cerca de 50 idiomas, com a preocupação de que cada conceito fosse compreendido na realidade das diferentes localidades em que o documento circulasse. O trabalho de divulgação é realizado pela sede internacional do movimento, que fica na Costa Rica e que desenvolve recursos básicos para estabelecer a ponte entre os diferentes mundos que se envolveram nesse movimento. Cerca de 100 países têm hoje alguma parceria e afiliação com a Carta da Terra. “Grande parte do nosso trabalho é estabelecer conexões entre as várias experiências com a Carta da Terra em todo o mundo”, diz Miriam. Um exemplo prático é o esforço do movimento para colocar em contato professores de diferentes partes do mundo que estão trabalhando a Carta da Terra em sala de aula, para que eles possam trocar experiências e com isso aperfeiçoar idéias e soluções de aplicação do documento nas instituições de ensino.
Há exemplos de trabalhos desenvolvidos com a aplicação da Carta da Terra?
Um caso prático de adoção da Carta da Terra por uma instituição internacional foi a aliança com a Global Reporting Initiative (GRI), que lançou um estudo de comparação dos valores agregados pelas diretrizes do GRI, pela Carta da Terra e pelo Pacto Global das nações Unidas.
Outro exemplo é o desenvolvimento de um curso sobre os princípios da sustentabilidade que está sendo compartilhado por universidades da Índia, do México e da Costa Rica. Com quatro módulos e vinte seções, o curso apresenta uma análise teórica e prática de cada um dos princípios da Carta da Terra. Seu alcance dá uma idéia da transcendência do movimento, que ultrapassa qualquer barreira nacional e se consolida como uma movimentação global.
Um terceiro exemplo é a publicação de um instrumento chamado EC-Assess, que se constitui numa metodologia de avaliação de ações de responsabilidade social desenvolvida a partir dos princípios da Carta da Terra. A idéia é refletir sobre o alcance de cada princípio e entender por que, sendo tão importante, ele não está sendo implementado na prática.
Como deve ser a comunicação para a sustentabilidade?
Algumas questões foram levantadas em relação à forma como comunicamos a sustentabilidade. Como dar sentido a esse conceito para que ele atinja o maior número de pessoas? Como vincular, por exemplo, a Carta da Terra a outros programas que já tocam a sociedade brasileira, por fazerem sentido para as pessoas, seja despertando elogios, seja provocando críticas, como é o caso do Programa Fome Zero? É preciso mudar o processo habitual de educação, que separa tudo em diferentes “caixinhas”. O be-a-bá da sustentabilidade nos ensina a importância de conectarmos tanto as responsabilidades como as ações para resolver cada problema, considerando o princípio a ser seguido.
Qual é a importância da sensibilização nesse processo?
A Carta da Terra é um movimento que possui várias portas de entrada. Pode ser a paixão pela luta contra a desigualdade social, por exemplo, bem como causas ambientalistas ou em favor dos direitos humanos. No entanto, a principal porta de entrada é aquela que mostra para as pessoas, entidades e empresas que elas têm a capacidade e o poder de fazer algo. A Carta da Terra é, portanto, uma chamada para o protagonismo. Cada um pode ser protagonista do movimento no local em que vive ou atua. E isso se dá a partir da percepção de que somos parte do problema e podemos ser parte também da solução.
Onde saber mais sobre a Carta da Terra no Brasil?
Como parte do trabalho de descentralização do movimento, estão sendo desenvolvidos sites nacionais para relatar a experiência da Carta da Terra nos diversos países. As atividades brasileiras podem ser encontradas no site A Carta da Terra em Ação – A Iniciativa da Carta da Terra Brasil.
Fonte: Betina Sarue (Instituto Ethos) / Edição: Benjamin S. Gonçalves
Data: Agosto de 2009