O Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS) realizou, na última semana, o 3º Seminário de Marketing Relacionado a Causas, que reuniu especialistas, lideranças sociais e representantes do setor privado para mostrar como parcerias entre empresas e ONGs podem ser benéficas a causas sociais como um todo.
Por meio de um conjunto de casos analisados durante o evento, os debatedores defenderam o uso do Marketing Relacionado a Causas como um instrumento em que é possível agregar valor à marca comercial, ampliar os recursos financeiros e humanos das entidades, ao mesmo tempo em que leva a uma conscientização da população em geral.
Segundo o diretor-presidente do IDIS, Marcos Kisil, o conceito é, no fim, uma ferramenta que alinha as estratégias de marketing da empresa com as necessidades da sociedade. “Quando uma organização assume uma causa, conjuntamente a uma entidade social, tem o objetivo de transformar uma determinada realidade. É um compromisso permanente, realizado a partir de um código de ética”, argumentou.
Para dar certo, Kisil alegou que a prática deve estar alinhada ao “DNA da empresa”, e é respaldada por sua responsabilidade socioambiental. Sem essas condicionantes é possível que a comunicação das ações seja encarado como oportunista pela sociedade, cada vez mais crítica sobre as campanhas que unem o setor privado a práticas sociais. Conheça mais sobre o perfil dos consumidores.
Para entender como funciona essa forma de marketing, que começou a ser mais difundido no Brasil nos últimos anos, pode ser analisado o exemplo do banco ABN Amro Real. Por meio do projeto Amigo Real, o banco estimula que colaboradores e clientes destinem parte do Imposto de Renda devido para os Fundos Municipais da Criança e do Adolescente.
Com a iniciativa, o banco, que tem a sustentabilidade como mote de suas ações, agrega valor a sua imagem, ao investir em fundos públicos que destinam recursos a projetos sociais em prol de crianças e adolescentes. Os clientes e colaboradores ganham ao sentirem-se partícipes dessas ações e passam a cobrar dos conselhos municipais, que definem o direcionamento desses recursos, mais monitoramento e critério na definição dos projetos contemplados.
“O que se faz é facilitar o processo entre os doadores e os fundos. Por outro lado, o banco também tem o papel de fortalecer esses conselhos, como parte de seu investimento social”, afirmou a superintendente de Desenvolvimento Sustentável do banco, Laura Oltramare. Segundo ela, só no último ano, o projeto Amigo Real arrecadou mais de R$ 4,8 milhões, em todo o Brasil.
Ao analisar o caso comentado por Laura, o diretor executivo do Instituto Avon, Lírio Cipriani, comentou: “É um caso em que evidentemente todos parecem ganhar. A empresa, as organizações sociais e a sociedade. Uma marca que valida o MRC”.
Pesquisa – Durante o seminário, também foram apresentados os resultados da pesquisa Cenário Brasileiro do Marketing Relacionado a Causas: Atitudes e Comportamento das Empresas e das Organizações da Sociedade Civil. O levantamento estudou as atitudes e comportamentos de empresas (88) e organizações sociais (92), que trabalham com MRC. Veja pesquisa completa.
Para a presidente da Enfoque Pesquisa de Marketing, Zilda Knoploch, responsável pelo levantamento, a pesquisa apontou para uma evolução a partir alguns pontos fundamentais. O primeiro foi o aumento da motivação das empresas para valorizar sua marca a partir da adoção de programas de MRC. “O primeiro estudo, realizado em 2003, apontava apenas 10% de aceitação. Em 2007, esse número foi para 76%”, explicou.
Ao mesmo tempo, a medição mostrou que as áreas corporativas envolvidas no processo também foram ampliadas. No ano de 2003, em apenas em 10% dos casos a presidência e diretoria participavam das decisões, enquanto que, em 2007, esse percentual foi para 66%. “Isso mostra que, cada vez mais, o setor privado vê as causas sociais como algo estratégico para seus negócios”, garante Zilda.
Outro ponto fundamental na visão da responsável pelo estudo é a duração das parcerias. Pelo levantamento, 48% das ações têm prazo indeterminado, contra 10% daquelas com até um ano, e 6% das que duram apenas um dia – o convencionado “Dia D”.
Boas parcerias – Embora os resultados de êxito sejam expressivos, os debatedores também concordaram que o entendimento entre organizações sociais e empresas nem sempre é fácil. A pesquisa apontou que 71% dos contratos podem chegar a até seis meses de negociação;.19% podem levar um ano.
A superintendente de Relações Corporativas e Marketing do WWF-Brasil, Mônica Rennó, uma das convidadas do seminário promovido pelo IDIS, concorda que, muitas vezes, a relação pode ser complicada. Segundo ela, empresas e organizações podem ter divergências sobre as formas em que o trabalho conjunto pode ser desenvolvido. Daí a demora em encontrar consensos.
Um problema pontual que exemplifica a dificuldade em fechar acordos vem da ONG Doutores da Alegria, organização que humaniza, por meio do riso, as relações entre crianças enfermas e instituições hospitalares há 15 anos. O diretor executivo da ONG, Luis Vieira da Rocha, lembra quantas vezes teve que dizer não a certos abusos dos doadores.
“Não deixamos que a área de comunicação e marketing da empresa use fotos das crianças doentes, por mais que insistam. É uma política nossa de respeito às crianças e suas famílias. Se quiser utilizar imagens, elas deverão ser dos palhaços”, afirmou aos participantes do seminário, garantindo que possui uma espécie de carta de princípios, a qual todos os parceiros devem seguir. Critérios, enfim. Veja como ser parceiro.
É nesse contexto que o código de conduta levantado por Marcos Kisil torna-se mais evidente, no que chama de postura ética e transparente entre os parceiros. Para ele, não é fácil fazer a integração, mas se balizadas por comprometimento e objetivos claros para ambas as partes, as ações podem ser levadas a diante.
O IDIS elaborou dez princípios e premissas, que devem orientar um programa de MRC para ser bem sucedido. Conheça, abaixo, os principais pontos:
1. Ética e transparência
Os parceiros devem manter uma postura ética e transparente na concepção e implementação do programa com todos seus públicos de interesse.
2. Objetivos claros
Deve-se buscar um objetivo comum a ser alcançado com o programa e deixar claro os objetivos específicos de cada um dos parceiros.
3. Comprometimento
Os parceiros devem estar comprometidos no longo prazo, a alta gerência deve ser envolvida e os acordos formalizados. A parceria deve ser realizada com seriedade, otimismo e perseverança.
4. Visão de Responsabilidade Social e Desenvolvimento Sustentável
O programa deve ser norteado por uma visão de responsabilidade social e de desenvolvimento sustentável.
5. Valores compartilhados
Os parceiros devem compartilhar valores que estejam alinhados com a causa do programa.
6. Respeito mútuo
Os parceiros devem respeitar suas diferenças, valorizar seus ativos e aproveitar a expertise de cada um para promover o aprendizado mútuo.
7. Excelência
Os parceiros devem buscar a excelência na operacionalização de todas as suas atividades, sejam elas de negócio, prestação de serviços ou institucionais.
8. Autonomia
Os parceiros devem zelar pela sua missão e valores e manter sua sustentabilidade, independentemente do programa.
9. Monitoramento e avaliação
O programa deve ser monitorado e avaliado para viabilizar os ajustes necessários, e a prestação de conta deve ser constante junto aos públicos envolvidos.
10. Benefício mútuo
A parceria deve beneficiar todos os envolvidos: a causa, a empresa e a sociedade.
Fonte: RedeGIFE ONLINE
Publicado em 29/10/07
Rodrigo Zavala