Para comunicadores de organizações da iniciativa privada, além de desconhecimento, jornalistas dos mais diferentes meios têm certo preconceito sobre as ações sociais das empresas. Enquanto isso, nas redações, repórteres e editores percebem que as informações passadas não têm impacto comunitário avaliado ou mesmo interesse jornalístico.
No Workshop GIFE-Aberje de Comunicação, realizado na semana passada, os dois grupos de profissionais se reuniram com o objetivo de criar estratégias para melhorar e qualificar o relacionamento entre ambos. Nesse sentido, propor entendimentos sobre a confusão conceitual sobre a Responsabilidade Social Empresarial (RSE) e Investimento Social Privado (ISP).
Com o patrocínio da Comgás e do Instituto Avon, o evento promoveu um diálogo aberto com 66 profissionais, entre jornalistas dos mais variados veículos, assessores de imprensa, publicitários, relações públicas e gestores de comunicação de empresas. Ao trabalharem em grupos focais, eles responderam a três perguntas: para que serve, como é percebida e quais as principais estratégias para lidar com os conflitos entre interesses privados e públicos na comunicação sobre RSE e ISP?
“Estamos em um processo de mudança desses conceitos. Por isso, a confusão sobre nomenclaturas e seus significados. Isso afeta a todos e dificulta a construção de consensos”, afirmou o secretário-geral do GIFE, Fernando Rossetti.
Dissonâncias – Embora a troca de farpas entre assessores de imprensa e jornalistas seja comum nas mais distintas áreas, quando se trata da cobertura de uma agenda social pautada pela iniciativa privada, o debate ganha novos contornos. Afinal, segundo o gerente de marketing para o segmento financeiro da Microsoft Brasil, Roger Melo, o bem comum pode estar ligado à atuação da empresa.
“Deve estar claro que o objetivo da comunicação empresarial é a empresa. A Microsoft, por exemplo, combate a exclusão digital, uma questão hoje de cidadania. Os projetos trazem impactos e benefícios à população, que não podem ser dissociados da imagem da organização”, argumentou Melo.
A colocação levantou algumas dúvidas em outros participantes. Uma jornalista, que preferiu manter seu nome in off (jargão jornalístico empregado quando é para manter tudo em segredo) questionou: “mas as pessoas assistidas pelos projetos de inclusão digital de uma empresa de informática não serão, futuramente, os consumidores dessa mesma organização?”
Analisados de perto, esses dois personagens são exemplos claros das rusgas entre a comunicação do setor privado e das redações. Enquanto o primeiro evidencia a influência do investimento social ao negócio, o segundo parte para uma tese fundamentada em um descrédito pessoal como base de apoio ao discurso “fazer transparecer a intenção real”, e não a investigação jornalística do caso.
Pesquisa – As dissonâncias entre os dois públicos foram dissecadas na pesquisa especialmente elaborada para o Workshop, Os Desafios na Comunicação da Ação Social Privada. Realizada pela Databerje (departamento responsável pelos estudos da Aberje), a mensuração tem como base um questionário enviado aos responsáveis pela área de comunicação de 71 organizações associadas ao GIFE.
Um dos pontos que mais chama atenção é a falta de alinhamento conceitual, que trouxe uma situação paradoxal. Embora a maioria (91%) se considere muito bem informada sobre o campo social, quando são testadas as conceituações em voga sobre as diferenças entre ISP e RSE, grande parte dos entrevistados se equivoca. Nesse sentido, fica em suspeição o argumento que, as dificuldades de se comunicar se devem a falta de compreensão dos jornalistas nas redações sobre o tema (como apontado em 35% das respostas).
Para entender o problema é preciso analisar as definições acordadas entre o Instituto Ethos e o GIFE nos últimos anos. Segundo Fernando Rossetti, na RSE os recursos são privados e voltados para fins também privados, pois se tratam de ações éticas voltadas ao negócio. Já o ISP corresponde a recursos privados para fins públicos, quando o investimento é condicionado para uma comunidade ou causa social.
O equívoco dos entrevistados se encontra nesse ponto: apenas 28% dos respondentes entendem essa diferenciação. “Mas não é culpa deles. Esses conceitos estão em transformação no mundo inteiro”, defendeu Rossetti.
Outro resultado que tende a – desnecessariamente, na opinião dos especialistas – polemizar o debate é o fato de que 87,3% acreditarem que o investimento social gera vantagens de mercado para empresas. Segundo a diretora do Databerje, Suzel Figueiredo, o ISP objetiva o interesse público. “É legítimo que as empresas tenham um maior valor agregado para sua imagem como conseqüência de um investimento gerador de impacto social. No entanto, isso deve ser subproduto e não atividade-fim”, analisou, com base nas conclusões da pesquisa. A mesma lógica que Roger Melo diz seguir.
Conclusões – Nos grupos de trabalho, os participantes abordaram essa linha de raciocínio, ao apontar estratégias para lidar com os conflitos. Um dos consensos é o dever de quem faz a cobertura em acompanhar a trilha do investimento realizado na ação social e avaliar o impacto produzido na sociedade. Além disso, deve acabar com a cultura de trabalhar com cases, mas debater o tema com um conjunto maior de fontes e trabalhos similares.
Segundo o ombudsman do jornal Folha de S. Paulo, Mário Magalhães, o dever do repórter é investigar. “O jornalista informa. Não existe aquele idealismo universitário que ele vai mudar o mundo. Ele deve simplesmente dizer o que acontece com o máximo de dados e isenção”, afirmou, ao analisar os resultados das discussões dos grupos.
Por outro lado, quando a discussão se voltou para as organizações, apontou-se como estratégico ter transparência nos objetivos da comunicação e alinhar, por meio de um relacionamento mais efetivo, os conceitos de RSE e ISP. “Cansei de ver releases vendendo o Éden na Terra. O assessor deve contextualizar, dizer honestamente o que deu certo dentro das metas objetivas do programa que pretende divulgar. Será pior o resultado se o jornalista investigar e vir que a o resultado não tem o monitoramento sugerido”, advertiu Magalhães.
Fonte: RedeGIFE ONLINE – 05/11/2007
Rodrigo Zavala