Há dezessete anos, um dos mais importantes documentos do século XX foi assinado em Jomtien, na Tailândia, por 183 países. A Declaração Mundial sobre Educação para Todos jogou luzes sobre a importância de oferecer às crianças de zero a seis anos espaços educativos qualificados, onde o cuidar e o educar se complementam, para estimular o seu desenvolvimento pleno.
Dentro dessa nova perspectiva, descartou-se a idéia de que creches são espaços destinados a oferecer às crianças apenas alimentação, saúde e segurança, enquanto as mães trabalham. Creches e pré-escolas são espaços de educação e que devem ser tratados com prioridade pelas instâncias governamentais, pela família e pela sociedade.
Estudos demonstram os impactos positivos sobre uma criança quando ela passa a freqüentar instituições educacionais de qualidade. A partir daí tornam-se expressivas as conquistas alcançadas nas habilidades lógicas, musicais, comunicativas, emocionais, motoras e de convívio social. Em se tratando de famílias com baixo poder aquisitivo, com reduzidas possibilidades de garantir a seus filhos uma gama variada de estímulos mais complexos, os impactos positivos observados se tornam mais visíveis, sobretudo a longo prazo.
Um estudo da universidade de Chicago feito pelo prêmio Nobel em economia James Heckman e pelo o economista brasileiro Flávio Cunha, entre outros pesquisadores, apresentado recentemente no Brasil, comprova as vantagens de se fazer junto a crianças pobres investimentos educacionais elevados na primeira infância. Desse universo, constatou-se que as crianças, já na fase adulta, tiveram a possibilidade de melhores salários e postos de trabalho e que as meninas apresentaram menor probabilidade de engravidar durante a adolescência e os meninos sofreram brutal redução dos índices de violência na fase juvenil.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 definiu que o acesso à educação inicial é parte do direito de todo brasileiro. Com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em 1996, as creches – para crianças de zero a três anos – e pré-escolas – de quatro a seis anos – passaram a integrar o sistema de educação básica dos municípios. No entanto, dos 21,7 milhões de crianças, com 0 a 6 anos, segundo o PNAD/2004, apenas 40,4% freqüentam uma instituição de educação infantil ou de ensino fundamental. Mesmo com a expansão crescente de ofertas de creches e pré-escolas ainda é baixa a cobertura da rede pública.
Ainda que existam grandes lacunas na oferta de vagas e disparidades no padrão de qualidade ofertada, felizmente há atores envolvidos nessa causa. Participam movimentos organizados, sociedade civil, institutos empresariais e famílias. Investir na formação continuada de profissionais da educação infantil foi a forma identificada pelo Instituto C&A para participar dessa ampla cruzada.
Criado há 15 anos, o Instituto aplicou US$ 50 milhões em 1.200 projetos sociais em todo o Brasil, envolvendo cerca de 1 milhão de crianças, adolescentes, educadores e agentes de investimento social. Além de apoiar projetos de ONGs em 44 cidades do país, a organização investe no desenvolvimento de metodologia para formação de profissionais que atuam na educação infantil.
Com esse gesto, a instituição, que conta com um corpo de cerca de três mil funcionários voluntários, acredita que pode multiplicar a capacitação e auxiliar na construção da gestão democrática da escola e na identificação de novos materiais didático-pedagógicos. São esforços que, isolados, ainda não rompem com a dramática situação das crianças pobres de nosso país, mas que, dentro de um movimento maior da sociedade, podem sustentar a formação de nossos futuros cidadãos.
Fonte: www.gife.org.br
Paulo Castro, Presidente do Instituto C&A