Por Maria Elena Johannpeter (*)
Este artigo é destaque na Edição 32 de Plurale em revista que está circulando
Desenvolver a responsabilidade de ser transparente e planos de gestão na busca de resultados não é uma ação exclusiva de empresas ou de governos. Ao Terceiro Setor também é fundamental a profissionalização e transparência em suas práticas, para que seja autossuficiente e efetivo em suas missões.
Segundo o IBGE, no Brasil existem 338 mil ONGs, que respondem por 5% do PIB do país, o que representa o montante significativo de cerca de 32 bilhões de reais. Mas tornar as instituições mais eficientes e beneficiar um número maior de pessoas não depende apenas de recursos financeiros. A questão central é trabalhar a gestão dos projetos e acompanhar minuciosamente sua expansão.
A ideia de que o Terceiro Setor é sustentado somente por idealismo é uma visão ingênua e utópica. Se o profissionalismo não entrar em cena, os sonhos não se concretizam e resultados não são alcançados. Ainda mais com o crescimento da cobrança por transparência. Por mais que a causa seja nobre, nenhum empreendedor social quer encaminhar recursos financeiros, tanto humanos e materiais, em um projeto que não mostra evoluções ou que não permite o acesso as suas informações.
A falta de transparência e de controle contribuiu para o surgimento de instituições fantasmas, fato que ganhou visibilidade na mídia no ano passado. Os questionamentos quanto a seriedade de alguns projetos sociais criaram dificuldades aos demais não só para a captação de recursos, mas também para o envolvimento da sociedade no trabalho. Por isso, na Era da Informação, um trabalho ético e estratégico, aliado à prestação de contas, virou pré requisito para a manutenção e crescimento das organizações. Dessa forma, quando a organização impede o acompanhamento de suas práticas, está fechando as portas a investimentos públicos e privados. E ao não apresentar comprometimento em alcançar metas, os projetos sociais acabam sendo um dos primeiros cortes em momentos de recessão nas empresas. Profissionalização em gestão e voluntariado confere credibilidade aos projetos sociais.
Ao encontro dessa necessidade de capacitar o setor é que a ONG Parceiros Voluntários, em parceria com o Fundo Multilateral de Investimentos do Banco Interamericano de Desenvolvimento – FUMIN/BID, patrocínio da Petrobras e uma grande rede colaborativa se uniram para a construção da metodologia, “Desenvolvimento de Princípios de Transparência e Prestação de Contas em Organizações da Sociedade Civil”. O trabalho foi executado entre os anos de 2008 e 2011, envolvendo, no projeto piloto, a participação de 148 representantes de 76 organizações sociais, em 21 cidades do Rio Grande do Sul. Cada etapa da capacitação teve duração de oito meses, com 80 horas de curso presenciais e mais 20 horas semipresenciais. Após este processo, as instituições continuaram recebendo consultoria de especialistas por um período de 10 meses. O resultado foi a formulação e implantação de práticas concretas de gestão que elevaram o nível organizacional das entidades envolvidas. Dentre elas, 85% buscaram novas parcerias, 79% desenvolveram novos projetos, 90% implantaram rotinas de prestação de contas, 95% passaram a disponibilizar suas prestações de contas aos stakeholders, sendo que 76% obtiveram aumento de receita e 87% implementaram novas ferramentas de gestão.
Um exemplo da eficiência da metodologia aplicada são os frutos colhidos pela Sociedade Espírita Estudo e Caridade – Lar de Joaquina, de Santa Maria (RS). A instituição aumentou sua receita, encontrou novos parceiros, dobrou o número de projetos, passou a oferecer atendimentos psicológico, nutricional e de assistência social, e cursos de música e computação. A APAE de Santa Rosa (RS) também mudou sua lógica de trabalho e conseguiu maior visibilidade com novas estratégias de comunicação. Passou a divulgar suas ações em site, jornais e emissoras de rádio da região, e criou peças informativas, vídeo institucional e um canal de telemarketing. Entre as mudanças administrativas, estão a implantação de nota fiscal e software em rede para qualificar e dar agilidade a seus processos. A transformação trouxe sustentabilidade com 64 novas parcerias.
A metodologia, os processos aplicados e os resultados estão expostos no livro ONG – Transparência como Fator Crítico de Sucesso, lançado pela Parceiros Voluntários em maio de 2012. A obra mostra que o fortalecimento do Terceiro Setor não requer fórmulas complicadas ou revolucionárias, somente uma gestão bem articulada, um sistema de prestação de contas e um relacionamento com as Partes Interessadas que reforce os laços de confiança interpessoal e redes de cooperação para a produção de bens coletivos. Para as 76 instituições, a equação deu muito certo. O que queremos agora é que empresas, governos e fundações avaliem a metodologia construída e pensem nela como um pré requisito estratégico para seus investimentos sociais.
ONGs organizadas atraem não só investimentos financeiros, como também parceiros. O recurso humano voluntario traz sua grande contribuição e permanece nas organizações sociais que tenham eficiência e eficácia em sua gestão. O potencial do voluntariada não deve ser desprezado. Segundo Lester Salamon, catedrático da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, e um dos pioneiros na pesquisa científica sobre o Terceiro Setor, “se todos os voluntários formassem um país, este país seria o segundo maior do mundo”. No Planeta, o valor econômico da força de trabalho do voluntariado representa a fabulosa cifra de 1,3 trilhão de dólares. E mais: a pesquisa encomendada ao IBOPE pela Rede Brasil Voluntário, em final de 2011, aponta que um em cada quatro brasileiros, com mais de 16 anos, já fez ou faz trabalho voluntário. São 35 milhões de pessoas em ação. Esses dados ilustram o quanto o Terceiro Setor é fundamental na economia de um país e o quanto é necessário e urgente contribuir para a sua sustentabilidade.
Sobre a ONG Parceiros Voluntários: A teia social criada ao longo de 15 anos de atividades (fundada em 1997) está beneficiando 1,5 milhão de pessoas por meio da atitude solidária de quase 400 mil voluntários que prestam serviços em 2.784 organizações sociais conveniadas às Unidades instaladas em 51 cidades gaúchas. Os dados do Relatório Anual de 2011, indicam 2 mil escolas e 2,5 mil empresas mobilizadas. Desde sua fundação, a Parceiros Voluntários assessora gratuitamente entidades beneficentes e de assistência social, suas lideranças e seus usuários, no fortalecimento de seu protagonismo, capacitando-os para a gestão sustentável.
O processo de planejamento estratégico mobiliza a Organização, desde seus voluntários aos integrantes do Conselho Deliberativo, com ampla consulta às partes interessadas. A partir de 2003, passou a utilizar a ferramenta BSC – Balance ScoreCard –, com a consultoria voluntária da empresa Symnetics Business Transformation, de São Paulo. O aprendizado tem contribuído para o fortalecimento de uma cultura de monitoramento de resultados.
(*) Maria Elena Pereira Johannpeter é colunista de Plurale, colaborando com artigos sobre sustentabilidade. É Presidente (Voluntária) da ONG Parceiros Voluntários.www.parceirosvoluntarios.org.br