A pergunta do título é pertinente. Aumenta o debate sobre as políticas de sustentabilidade nas empresas e no mercado. Em tese, elas deveriam contribuir para resolver as crises financeira e climática. Mas não é o que se vê. Muitas empresas que hoje trabalham a sustentabilidade apresentam sua gestão numa “escadinha evolutiva”: primeiro foi a fase do investimento social privado em ações e projetos comunitários, culturais etc.; depois veio a fase da gestão responsável e, agora, a da sustentabilidade. Isso significa que a responsabilidade social empresarial ficou para trás, que é coisa do passado?
Avaliemos. Ganhou terreno nos anos 1990 a idéia de que faz parte do papel das empresas tratar dos problemas sociais. Esse conceito foi aceito e assimilado, fazendo com que as empresas saíssem de uma postura defensiva e assumissem a iniciativa nos temas sociais. Elas iniciaram um processo de diálogo com as partes interessadas no negócio que permitiu minimizar os impactos negativos de suas atividades e potencializar os ganhos para vários setores da sociedade.
No entanto, houve dificuldade em incorporara esse diálogo no coração do negócio e na sociedade. Isso só veio a acontecer com a emergência das questões relativas ao aquecimento global. Mas as mudanças de processos em andamento abarcam apenas os problemas ambientais, deixando de lado a distribuição de riquezas. As empresas não conseguem avançar no modelo de gestão, no planejamento e na adoção de práticas transformadoras do mercado e da sociedade.
É preciso ressaltar os progressos havidos em relação a alguns temas, como o combate ao trabalho escravo, ao trabalho infantil e à corrupção. No entanto, o cerne da responsabilidade social empresarial, que é o forte viés de “produzir resultados para todos”, ainda não está nem perto de acontecer. Por meio de uma gestão baseada no diálogo com as partes interessadas, a empresa socialmente responsável consegue promover um processo que distribua as riquezas produzidas para toda a sociedade.
A consciência das mudanças climáticas trouxe avanços para o movimento. Um deles é o fato de o aquecimento global ser entendido como uma oportunidade de negócio única.
Haverá a necessidade de se repor tudo o que existe – produtos, serviços, processos – para fazer emergir uma economia de baixo carbono. O perigo do retrocesso reside, justamente, nessa oportunidade. Uma vez que a mudança pode ser feita com os mesmos princípios e valores da “economia velha”, que precisa ser substituída, a distribuição das riquezas pode não ocorrer. As empresas ganham a “boa vontade” dos consumidores e da sociedade, mas nada muda na prática. Estaremos, assim, “fazendo mais do mesmo”.
O desafio é superar esse impasse, associando a responsabilidade social ao protagonismo das empresas na transformação que está vindo. Mas qual protagonismo? Na verdade, podemos dizer que são “protagonismos”, como o de criar e praticar novos padrões de produção e de relacionamento com o mercado, o de desenvolver a cadeia de valor, o de influenciar políticas públicas e o de provocar o Estado a também mudar suas práticas, estabelecendo incentivos e critérios de compras que privilegiem a economia verde.
O mundo futuro está sendo desenhado a partir das crises atuais e seus padrões ainda estão sendo definidos. Vai defini-los quem tiver protagonismo e liderança.
* Paulo Itacarambi é vice-presidente executivo do Instituto Ethos.