Mudanças paradigmáticas na comunicação empresarial, iniciadas na década de 90, transformaram o perfil dos profissionais que trabalham na área. Mais do que informar, os comunicadores têm um papel de destaque no planejamento estratégico, na política e no relacionamento da empresa com os públicos interno e externo.
As conclusões estiveram presentes na terceira edição do Workshop GIFE de Comunicação, realizado no último dia 24. Com o patrocínio de O Boticário, o evento reuniu 80 profissionais, entre jornalistas dos mais variados veículos, assessores de imprensa, publicitários, relações públicas e gestores de comunicação de empresas, institutos e fundações, para dialogar e apontar caminhos para a melhoria das relações entre esses profissionais e o aperfeiçoamento de seu trabalho.
A reflexão teve como princípio dominante promover a qualificação das informações sobre Investimento Social Privado produzidas e divulgadas por todos esses atores. No entanto, no limiar do debate, as análises ultrapassaram as fronteiras do tema, gerando um conteúdo mais profundo sobre os novos desafios enfrentados por esses profissionais e a natureza de seu trabalho.
Segundo o diretor-presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Empresarial (Aberje), Paulo Nassar, a complexidade dos novos paradigmas organizacionais, que não existiam há um par de décadas, tornou os projetos de comunicação verdadeiros processos educativos. A reestruturação produtiva dos anos 90 fez a área de comunicação das empresas adotar parâmetros distintos. Além da utilidade e da compatibilidade, essas organizações deveriam ser percebidas por sua transcendência.
“A transcendência abriga todas as responsabilidades empresariais: social, histórica e comercial, que implica na necessidade de as empresas se institucionalizarem e não serem percebidas apenas por sua presença no mercado”, argumenta Nassar. Para ele, o desafio é encontrar uma retórica para públicos diferentes. “O comunicador é um mestiço, que deve saber se relacionar com a imprensa, comunidade, funcionários, colaboradores, entre outros”, acredita.
Informar, assim, é apenas mais um dos eixos de trabalho. Para Nassar, é preciso saber como as informações chegam, se elas são entendidas pelo público e como este passa a trabalhar com o conteúdo recebido. “As temáticas são complexas e diversificadas. A questão de gênero, por exemplo, pode ser trabalhada como uma questão interna, como um elemento da responsabilidade social e como política da empresa”, argumenta.
Alinhamento – A discussão de problemas mais macros enfrentados pelos comunicadores foi possível por estar atrelado a discussões pregressas, realizadas nas edições anteriores do workshop. Na última edição do evento, em 2005, patrocinada pelo Instituto Synergos, 86 profissionais realizaram exercícios de reflexão sobre o tema. O resultado foi um diagnóstico de desafios e oportunidades que ajudou tanto no alinhamento conceitual sobre ISP, como a despertar uma visão mais amplificada das possibilidades de divulgação.
O exercício também resultou na elaboração coletiva de dicas para todos os públicos que se envolvem na produção das informações e das estratégias de comunicação das ações sociais. Essas dicas deram origem ao livro Como divulgar ações sociais de empresas*, patrocinado pelo Instituto Algar e Fundação Itaú Social, e entregue a todos os participantes do workshop 2006.
Segundo Jussara Mangini, coordenadora de Comunicação do GIFE e organizadora do livro, além de contextualizar o envolvimento da iniciativa privada com a resolução dos problemas sociais do país, a publicação traz, de forma didática, dicas práticas e estratégicas sobre como usar a comunicação de forma eficaz para mostrar a relevância das ações sociais de empresas para a sociedade.
“O livro traz aos comunicadores uma devolutiva do trabalho que o GIFE faz há algum tempo. Ele é resultado de um ambiente de comunicação que alinha diferentes conhecimentos, com foco no imaginário social. E os comunicadores têm um papel importante para alinhar diferentes experiências e contribuir para uma mudança social”, acredita o secretário-geral do GIFE, Fernando Rossetti.
Reputação – Mais do que o novo perfil dos profissionais de comunicação, outro ponto fundamental é a desconfiança – seja por parte da imprensa, seja pela própria sociedade – sobre o “negócio” social encampado por muitas empresas. Isto é, ações comunitárias rasas, que sob as mais variadas formas, são ardilezas para a organização fazer seu marketing.
Para o publicitário da agência Setor Dois e Meio, Percival Caropreso, um dos maiores equívocos é uma empresa fazer uso do marketing social quando inicia práticas de responsabilidade socioambiental. “É a porta dos fundos, que leva direto a um porão do qual ela não vai sair mais. O público percebe esse truque e o dano à reputação da empresa é irreversível”, argumentou durante palestra.
Segundo ele, é preciso atrelar a marca à causa, criando uma coerência entre a identidade da organização e seus projetos sociais. “Essa é a prova dos nove da prática. A empresa deve ter uma estratégia corporativa, que baseará suas ações. É preciso identificar que tangências e aderências sociais existentes.”
Caropreso foi um dos responsáveis pela campanha Nós Podemos, de 2002, que lançou nacionalmente o movimento em prol dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM) da Organização das Nações Unidas (ONU). “A campanha teve como meta tornar mais palpável para o cidadão como ele pode contribuir. Os ODMs são muito pomposos, precisávamos de alguma mensagem que rompesse a inércia da população, ao informar, sensibilizar, conscientizar e, por fim, mobilizar”, afirma, ao lembrar que a iniciativa atingiu diretamente um público de 5 milhões de pessoas e foi exportada para 22 países.
Uma das explicações para o sucesso da campanha, na visão de Caropreso, foi a capilarizada das informações para empresas (incluindo mídia) e organizações do terceiro setor. “Além disso, a mensagem é simples e fácil de entender. Ela usa técnicas que, nós comunicadores, devemos usar não apenas para vender desodorantes, mas para alavancar ações sociais”, argumenta.
Informal – Com desafios cada vez maiores, os comunicadores precisam buscar formas concretas de chegar aos seus públicos. No entanto, os convidados do workshop GIFE disseram não haver fórmulas para isso. O diretor de responsabilidade social do Grupo YPY de Comunicação, Luís Roberto Ferreira, deixou claro que o processo de comunicação é amplo, não é formal ou mesmo ortodoxo.
Os relacionamentos, segundo ele, estão na base do processo. “É preciso investir nessa estratégia. Por mais que não sejam claras, a principio, são elas que permitiram uma articulação dos diferentes meios”, lembrou.
Ferreira deu como exemplo o caso da organização não-governamental carioca AfroReggae. Criada na década de 90, a ONG é referência no trabalho com jovens em situação de risco em favelas do Rio de Janeito, principalmente na mediação de conflitos entre os moradores e o narcotráfico. “Em 13 anos, sempre nos preocupamos em construir uma ponte de mão dupla com diferentes classes sociais, com empresas e com a mídia”, contou o coordenador executivo do AfroReggae, José Junior, explicando como a ONG conseguiu se tornar modelo para todos esses setores.
Fonte: Rede GIFE ONLINE
Rodrigo Zavala
27/11/06