Michelle Aisenberg
Desenvolver habilidades de liderança, trabalhar em equipes multiculturais, conhecer de perto as necessidades de mercados emergentes, construir novas redes de relacionamento e desenvolver maior capacidade de adaptação. Essas são questões abordadas nos cursos de MBA das escolas de negócios mundo afora. Porém, em busca de experiências mais práticas e intensas, algumas empresas têm optado por enviar seus executivos para atuar como voluntários em ONGs ou entidades sem fins lucrativos em diferentes países. É o chamado sabático social.
A iniciativa não é comum no mundo corporativo, tanto pelo alto investimento quanto pela dificuldade de abrir mão dos profissionais durante certo período de tempo. Mas, na opinião de Mário Custódio, gerente da divisão de RH da consultoria de recrutamento Robert Half, trata-se de algo enriquecedor e que pode trazer ótimos resultados.
Segundo o especialista, a prática é mais adotada por multinacionais. “É muito importante para altos executivos de corporações com uma dinâmica multicultural terem essa vivência mais diversa. Isso facilita a criação de novos negócios e o trabalho em equipe”, afirma.
A farmacêutica britânica GlaxoSmithKline (GSK), por exemplo, encoraja seus funcionários com alto desempenho a serem voluntários de forma integral no período de três a seis meses em organizações não governamentais por meio do programa Pulse, lançado em 2009. Desde então, participaram da iniciativa mais de cem colaboradores globalmente, dos quais cinco brasileiros, que atuaram ou estão atuando em países como El Salvador, Haiti, Guatemala, Argentina e também no Brasil.
“Além do benefício direto às comunidades e organizações atendidas, o engajamento dos colaboradores fortalece a cultura interna da empresa. Isso melhora a criatividade, a proatividade e o trabalho em equipe”, afirma a diretora de RH Tatiana Melamed.
A gerente de RH Natália Cury, 33 anos, participou da primeira turma do Pulse. Um dos fatores que a estimulou a se inscrever no processo de seleção foi sua experiência com voluntariado social na empresa, onde trabalha há 12 anos. De janeiro a abril de 2010, ela trabalhou em El Salvador com a organização Save the Children, que possui um projeto de distribuição de kits para recém-nascidos carentes.
“A primeira mudança de comportamento já acontece antes mesmo do embarque. Fui me preparando para ser mais flexível, sabendo que estava começando uma experiência onde tudo poderia mudar de uma hora para outra”, afirma.
Durante seu sabático, Natália visitou 12 hospitais e, com o objetivo de contribuir para a redução da mortalidade infantil no país, usou sua experiência para desenvolver uma ferramenta de avaliação das ações realizadas pela ONG, de forma a torná-la mais eficiente. “É impressionante o amadurecimento pessoal e profissional que uma vivência como essa proporciona”, diz.
Já a alemã SAP escolheu Brasil, África do Sul e Índia como os locais de estreia de seu programa SAP Sabático Social no ano passado. Durante um mês, 30 executivos de equipes internacionais deixaram suas mesas e se tornaram voluntários em nove instituições sem fins lucrativos. Durante a seleção, critérios como potencial, avaliação de desempenho, experiência com voluntariado, liderança e capacidade de resolver problemas foram levados em conta.
“É um período em que nossos maiores potenciais se unem para resolver desafios de negócios junto a empreendedores sociais e pequenas e médias empresas em mercados emergentes”, resume Evan Welsh, diretor de assuntos corporativos da SAP. Ele veio a Belo Horizonte, onde trabalhou com mais oito companheiros da Alemanha, Estados Unidos, Holanda, Ucrânia e Canadá para desenvolver um plano de comunicação interna e externa para uma associação de reciclagem de lixo. “Voltei com uma experiência e novos aprendizados que jamais poderia ter imaginado”, diz.
Quem se prepara para viver uma aventura parecida é a diretora de comunicação Cristiana Brito. No mês que vem, ela embarca para Xangai para trabalhar com empreendedores ou alguma organização de fomento ao empreendedorismo social, que conhecerá apenas quando chegar. Ao todo, serão 30 dias de trabalho voluntário e a chance de desenvolver uma visão mais ampla do mercado mundial e melhorar a relação de instituições locais com outras no Brasil. “Vai ser uma das melhores experiências da minha vida”, diz.
Para quem questiona a necessidade de ir para o exterior para realizar trabalhos voluntários que poderiam ser feitos aqui mesmo no Brasil, Zuleica Modena, gerente de desenvolvimento de talentos e treinamento para a América Latina da John Deere, afirma que atuar em outro país dá a oportunidade de ver o mundo através de uma nova perspectiva. “Entender e apreciar as diferenças ajuda a desenvolver um líder global para o futuro. Fazer um trabalho fora da sua área de domínio e dia a dia aumenta a adaptabilidade e flexibilidade do profissional”, diz.
Zuleica foi a responsável por apoiar a implementação do programa de sabático social na fabricante de equipamentos agrícolas, em 2011. Chamada de Inspiring Leadership, a iniciativa busca o desenvolvimento de lideranças globalmente por meio da formação de times de 12 participantes que trabalham juntos antes, durante e depois de projetos desenvolvidos em lugares remotos ao redor do mundo – com organizações não governamentais e sem fins lucrativos -, em um formato de consultoria.
O programa já foi realizado na Tailândia, Tanzânia, China, Índia, Brasil e Estados Unidos. O gerente de marketing estratégico Fábio Dotto, por exemplo, passou o mês de maio deste ano em Chiang Mai, na Tailândia, trabalhando com cinco famílias de agricultores que cultivam produtos orgânicos. “Nosso principal projeto era desenvolver um plano de marketing, divulgação e comunicação, e criar um plano de crescimento para o negócio dessas pessoas”, explica.
Segundo o executivo, a experiência foi fundamental para seu desenvolvimento profissional. “Aprendi muito sobre administração e a criação de um networking sustentável”, afirma. Além disso, ele passou a entender melhor os diferentes idiomas, costumes e religiões. “Quanto mais você aprende sobre uma cultura, mais consegue fortalecer o relacionamento com o cliente e saber o que deve ou não fazer.”
Fonte: ABRADILAN