RICARDO VOLTOLINI
Milhares de livros já escritos não foram suficientes para explicar o que é liderança. No entanto, quem já viveu os percalços gerados por sua ausência sabe bem a falta que ela faz nas organizações.
Em sustentabilidade, a liderança costuma ser um fator fundamental de sucesso. Isso ficou bastante claro quando, em 2010, depois de uma série de entrevistas com executivos de empresas –que desembocaram no livro “Conversas com Líderes Sustentáveis” (Senac-SP/2011)– constatei que a sustentabilidade avançava mais em companhias nas quais era vista como oportunidade, estava inserida na estratégia de negócio, havia uma preocupação de envolver públicos de interesse, sobretudo, existia um ou mais representantes da alta liderança pessoalmente envolvidos com o tema e com o desafio de incorporá-lo à cultura da empresa.
Documentos mais recentes produzidos no âmbito do Pacto Global das Nações Unidas abordam a necessidade de um novo tipo de líder para os desafios do século 21. Mais do que um gestor diferenciado, esse líder deve ser capaz de operar estratégias de negócios que resultem em benefícios econômicos (acionistas, investidores, funcionários, fornecedores e governos), ambientais (preservação de recursos naturais) e sociais (desenvolvimento de pessoas e comunidades), influenciando na transição para uma nova economia, menos intensiva em carbono e mais eficiente no uso de recursos naturais e inclusiva.
Segundo nossa experiência, esse líder, que classificamos como “sustentável”– e que ainda forma um grupo de exceção no Brasil e no mundo–, distingue-se do perfil convencional por quatro aspectos básicos:
Primeiro, ele acredita, de verdade, nos valores que estruturam o conceito de sustentabilidade, como, por exemplo, o respeito ao outro e ao meio ambiente, a diversidade, a ética e a transparência. Mais do que isso, pratica-os, com rigor de procedimento, nas suas escolhas e decisões cotidianas.
Segundo, esse líder crê profundamente na noção de interdependência entre as dimensões econômica, social e ambiental que estão na base do conceito de “triplo resultado”-de tal modo que não aceita mais como legítimo nenhum lucro obtido em prejuízo do planeta e da sociedade.
Terceiro, ele tem coragem para promover mudanças em modelos mentais forjados na velha economia e, portanto, ainda impermeáveis à noção da sustentabilidade por razões filosóficas, mercadológicas ou operacionais.
Quarto e último aspecto, enxerga a sustentabilidade a partir da ótica da oportunidade, e trabalha, com invejável energia e coerência, para inseri-la no coração do negócio.
A essa altura, diante de tantos qualificativos, é justo se perguntar: sendo indivíduos com perfis tão específico, eles podem ser preparados nos programas corporativos e nas escolas de negócio? No meu mais recente livro, “Escolas de Líderes Sustentáveis” (Elsevier/2014), respondo que sim. Não só podem como devem. Mas, para atingirem tal objetivo, os programas convencionais de educação precisarão ser reconcebidos em seus propósitos, práticas e projetos pedagógicos à luz de conceitos como o da transdisciplinaridade, do pensamento sistêmico e da educação experiencial.
O desafio central, em nosso entendimento, será conferir ao terceiro vetor da competência –o da atitude (querer fazer)– a mesma ênfase que costumam ter os outros dois conhecimento (saber) e habilidades (saber fazer), pelo simples motivo, hoje mais razoável do que há 20 anos, de que a gestão de organizações já não pode mais ser vista como evento meramente técnico e isolado da vida. Decisões de negócio são, sim, e serão, cada vez mais, questões de natureza ética, na medida em que geram impactos que podem melhorar ou destruir os laços de uma comunidade, preservar ou esgotar os recursos da biodiversidade, vitalizar ou matar o solo, reduzir ou agravar o quadro de mudanças climáticas, diminuir ou ampliar as distâncias sociais.
Nesses tempos de aquecimento global e esgotamento de recursos naturais, cada vez mais valores vão gerar valor econômico. Líderes de valores serão, por essa razão, imprescindíveis. Para conhecer melhor como agem, como pensam e em que valores acreditam os líderes sustentáveis, recomendo acessar os conteúdos da Plataforma Liderança Sustentável (www.ideiasustentavel.com.br/lideres), movimento que reúne as histórias de 30 presidentes de grandes corporações brasileiras cuja missão é inspirar e educar jovens líderes para a sustentabilidade.
Fonte: Folha de S.Paulo
Data: 19/11/2013