O perfil que a mídia tem de sua empresa aponta os fatores que afetam a reputação. No entanto, para aproveitar as oportunidades e evitar riscos de imagem negativa, é preciso usar metodologia cuidadosa, como são as duas técnicas propostas neste artigo por Grahame Do wling e Warren Weeks, especialistas australianos em reputação.
A reputação é fator determinante para a credibilidade e o sucesso de uma empresa. A construção de uma reputação positiva exige tempo e esforço, mas há comprovações de que esse “lastro” inf lui de maneira positiva no desempenho operacional e financeiro da organização. Considerando que não se trata de um ativo tangível, mas sim de um aspecto que existe na mente das pessoas, cabe aos meios de comunicação, em grande parte, determinar o que as pessoas devem valorizar nas organizações e quais aspectos do desempenho devem ser avaliados.
O poder dos meios de comunicação não se origina apenas de seu alcance e importância, mas decorre também de seu papel de “certificador” de algumas organizações como atores legítimos, além da crença da população de que a imprensa tem acesso a informações privilegiadas e conta com mais conhecimentos técnicos para avaliar as empresas. Por outro lado, a mídia impressa alimenta um setor cada vez mais influente: o dos rankings de desempenho corporativo. Ao todo, a imprensa mundial publica mais de 50 rankings de reputação diferentes. Muitas empresas rastreiam o tom predominante do que se fala sobre elas, porém poucas avaliam quais atributos realmente impulsionam a fama corporativa. Os principais executivos, por sua vez, se limitam a aceitar os fatores usados como os aspectos-chave de seu perfil de reputação.
Este artigo descreve duas técnicas de avaliação da cobertura da imprensa de forma útil para a equipe gestora. A primeira: determinação de um perfil do que se comenta sobre as ações da empresa, seus produtos e serviços, a fim de compreender melhor a imagem que a mídia tem da organização. A segunda: utilização de uma linguagem mais descritiva para explicar as várias facetas do perfil de reputação da empresa, que poderia indicar as medidas corretivas com mais clareza do que uma “pesquisa de opinião”.
O que você avalia tem importância
Na essência dessas aferições de performance, estão algumas colocações sobre o que exatamente está sendo medido. O que significa estar entre as empresas mais admiradas dos Estados Unidos? De acordo com a revista Fortune, autora desse indicador desde 1984, significa que a organização obteve bons resultados em oito categorias: de solidez financeira a qualidade de gestão, passando por respeito ao meio ambiente e qualidade nas relações com a comunidade, entre outros indicadores. As categorias são definidas com base em pesquisas publicadas (lista de empresas mais admiradas, teorias sobre a administração, respeito e reputação) e na intuição: qualquer outro aspecto que os pesquisadores julguem importante. Depois, basta determinar como as pontuações individuais serão combinadas. No caso da Fortune, elas são somadas e todos os atributos recebem o mesmo peso.
Por causa de sua estrutura, os rankings têm valor limitado para os executivos que querem entender como determinado assunto pode afetar a imagem de sua empresa. E, embora essas listas sejam úteis para medir as opiniões e a confiança geral, para compreender os fatores que definem a reputação pode ser mais proveitoso ouvir as pessoas e também os jornalistas, pedindo que falem sobre a empresa a fim de identificar as expressões específicas utilizadas. Desviar a atenção de um conjunto preestabelecido de critérios de qualificação e voltá-la para as percepções ou crenças dos jornalistas sem o uso de um roteiro permite interpretar o que é debatido na mídia de uma forma nova e mudar o discurso corporativo do “é bom saber” para “precisamos saber”.
Vejamos os desdobramentos de três aspectos de um ranking (veja figura abaixo). Embora as três empresas (A, B e C) obtenham a mesma nota final e apareçam “empatadas” no que se refere à reputação corporativa, cada uma tem um perfil de qualificações bem diferente –e por isso as medidas que precisam ser tomadas pelos gestores também deveriam ser distintas.
O método de elaboração de perfil de reputação pode ser comparado ao estudo da seqüência do DNA corporativo. Trata-se de um método bem mais útil para diagnosticar os riscos e destacar as oportunidades, sobretudo porque o desempenho insuficiente em um território pode ofuscar a excelência em outros. A pesquisa que embasa este artigo demonstrou, por exemplo, que, se as pessoas acreditam que uma empresa trata de maneira inadequada os principais stakeholders (funcionários e consumidores), ela terá dificuldades para ganhar crédito mesmo quando divulgar ações positivas.
Como informar que o que você mede tem importância
Os perfis das empresas na mídia permitem que os executivos explorem as contradições entre o que a empresa afirma sobre si mesma nas comunicações externas (a “linguagem publicitária”) e a informação recebida pelos vários stakeholders (o que a mídia ou a “língua do povo” fala sobre a empresa). Vejamos o perfil de empresas da Austrália e das ilhas do Pacífico Sul, feito pela Cubit Media Research Pty a partir da análise de artigos publicados na mídia. As figuras das próximas páginas mostram aspectos distintos do perfil de reputação: a projeção na mídia, o tom adotado pela mídia e a discriminação da cobertura. Em conjunto, esses aspectos funcionam como um espelho que permite que as empresas olhem para sua verdadeira imagem.
Em geral, a mídia examina as empresas a partir de oito temas básicos, que incluem desde o modelo de negócio, definido em termos de “números absolutos” (como margens de lucro e participação no mercado), até o modelo social, que inclui condutas corporativas, como as iniciativas de responsabilidade social. Cada tema básico contém vários subitens –no caso do modelo de negócio, por exemplo, um deles seria a tendência real representada pelos lucros e o valor das ações na comparação com as expectativas.
Os temas são avaliados de acordo com o número de comentários favoráveis e desfavoráveis sobre uma empresa durante certo período em determinadas mídias e/ou por jornalistas específicos. Essa análise revela se uma empresa está “viva” na mídia ou se “está fora do alcance do radar”. A importância dos temas adotados também reflete se a empresa aparece em várias dimensões ou não.
Um artigo sobre a Apple, publicado na BusinessWeek com o título A bruise or two on Apple’s reputation”, ilustra essa teoria. A base da matéria é a seguinte pergunta: “Será que o principal serviço da empresa está à altura de seu hipe crescimento? Alguns clientes acham que não”. Os temas discutidos partem da teoria de que, à medida que novos produtos (como o iPod e o iPhone) ganham popularidade, começam a ser adquiridos por clientes menos devotos à empresa e com menor conhecimento da tecnologia.
Existe um comentário positivo de um cliente antigo e comentários negativos de dois clientes novos, acompanhados de fotos com sinais de insatisfação. Timothy D. Cook, diretor de operações da Apple, defende a empresa. Para ele, vários indicadores internos comprovam que o serviço nunca foi tão bom. A matéria destaca as contradições: Cook versus os dois clientes novos e versus um acadêmico que sustenta a teoria de que, quando a base de consumidores se diversifica, a satisfação torna-se mais difícil. Não faltam comparações: “Até as menores fissuras em uma reputação considerada perfeita podem ser sinal de problemas maiores. Quem não concorda só precisa perguntar para a Dell”. De acordo com uma empresa de pesquisa independente, o índice de satisfação do consumidor com a Apple caiu (de 83% para 79%), o da Hewlett-Packard aumentou (de 75% para 76%), assim como o da Gateway (de 73% para 75%), e o da Dell também apresentou queda (de 78% para 74%).
Definir o artigo como “basicamente positivo” ou “basicamente negativo” seria simplificar o amplo conteúdo. No entanto, a avaliação sob uma lente multifocal revela algumas questões importantes: temas estratégicos relacionados à expansão do mercado, inconsistências do setor no que se refere à satisfação do cliente (todas as empresas avaliadas apresentaram índices de aprovação próximos a 75%) e problemas no uso de produtos multifuncionais. Também fica claro um conflito: a contradição entre o que diz o diretor de operações da Apple e as palavras dos jornalistas.
Para a equipe gestora, outra vantagem desse perfil é a demonstração gráfica de vários aspectos da reputação da empresa, entre eles:
– Como ocorre com várias empresas líderes, a Apple conta com uma equipe de relações públicas responsável pela preservação da imagem positiva. No entanto, como demonstra o artigo da BusinessWeek, a construção dessa imagem envolve o risco de que a definição do tom e da agenda de temas fique a cargo dos jornalistas.
– Quando os temas abordados na mídia são basicamente negativos, pode ser sinal de problemas com os produtos e serviços da empresa.
– O que é publicado na mídia afeta diversos stakeholders. O artigo mencionado é um caso clássico de “vocês dizem” contra “nós dizemos”, o que exige uma resposta cuidadosa, tanto do setor de relações públicas da Apple (para os stakeholders externos) como da área de recursos humanos (para os colaboradores).
Como usar os perfis para fundamentar a tomada de decisão
Os perfis das empresas na mídia geram um debate imediato que permite tomar medidas de gestão mais embasadas, especialmente porque dividem cada macrotema (como a qualidade de serviço da Apple) em microtemas que o jornalista utiliza como argumentos (por exemplo, a relação entre o tamanho da base de clientes e a dificuldade para satisfazê-la).
Ao levar o foco para os microtemas, as empresas podem colocar em debate desde afirmações simples, como “nossa empresa tem uma reputação positiva (ou negativa)”, até questões mais complexas e significativas, como “embora nossos produtos tenham boa aceitação, nossa reputação sobre o serviço tem se mostrado problemática entre os novos clientes”.
Essa mudança de linguagem é importante porque facilita a tarefa dos executivos e do pessoal de relações públicas na hora de ligar o perfil da empresa na mídia com uma “reputação histórica” maior, que considera aspectos como missão, conduta e estilo de operação. Esse vínculo pode ter dois efeitos positivos. Primeiro, uma história corporativa baseada em atributos essenciais de reputação ajuda a “personalizar” uma empresa. Com isso, a organização pode se aproveitar do reconhecimento atribuído a realizações específicas. É o caso da 3M, por exemplo, que há décadas apóia-se na fama de empresa inovadora (recentemente, o slogan “Innovation” foi substituído pela frase “The Spirit of Innovation”) e em diversos relatos internos sobre seus esforços inovadores (como a invenção do post-it). O segundo resultado positivo de recorrer à trajetória histórica para basear a reputação é que, para os jornalistas e seu público, esses “casos” costumam ser mais interessantes do que uma reunião de dados e números.
Algumas vezes, os artigos publicados na mídia não refletem a posição de mercado que uma empresa deseja para si ou para seus produtos. Uma empresa de tecnologia que estudamos enfatizava as características inovadoras e funcionais de seu produto, mas os jornalistas preferiram destacar o estilo. É o que acontece quando, para contextualizar a análise, alguns jornalistas se baseiam em seus modelos mentais sobre o que é preciso para ser bem-sucedido em um setor. Se os executivos conseguem compreender esses modelos, também conseguem contrapor-se a uma cobertura equivocada e, ao mesmo tempo, saber qual o desempenho relativo de sua empresa segundo os atributos esperados do setor.
Ao se juntarem diversas empresas de um setor sob um mesmo perfil, é fácil identificar a “agenda” dos jornalistas refletida nos temas predominantes da mensagem. Também fica fácil saber quais organizações superam a concorrência. Nesse ponto, a mídia desempenha papel essencial, pois seleciona determinadas empresas como foco e, ao falar delas, coloca sua reputação no centro das atenções.
Depois de compreender os perfis de suas empresas na mídia, como os gestores devem reagir aos vários cenários?
Primeiramente, devem tentar proteger e melhorar os temas positivos da mensagem corporativa. É possível aproveitar esses aspectos fortes demonstrando a relação com alguns pontos da história geral da reputação da empresa. A General Electric, por exemplo, famosa pela forte ênfase nos lucros, não desfruta boa reputação no que se refere à consciência ambiental. No entanto, o lema atual, “Ecomagination”, promovido como “Inovação para a sustentabilidade”, está estimulando as pessoas a reconsiderar sua opinião sobre a empresa. Ao definir metas financeiras específicas para produtos que respeitem o meio ambiente, a GE está associando sua sólida “trajetória de lucro” com uma emergente “história ambiental”. A tentativa de criar o “efeito alavanca” atende também a uma importante necessidade de relações públicas: preencher um vazio de comunicação que convida os jornalistas a criticar a empresa ou estimula o público a acreditar que a organização não toma medidas para proteger o meio ambiente.
Em segundo lugar, é preciso enfrentar diretamente os aspectos negativos divulgados sobre a empresa. Para isso, os executivos podem considerar três possibilidades:
solucionar o problema que está provocando a cobertura negativa; caso isso seja impossível, criar a estratégia necessária e comunicar as medidas aos colaboradores e à mídia; ou, se a projeção negativa for o resultado de uma compreensão equivocada, corrigir por meio da oferta de novas informações para a mídia, talvez até “brifando” alguns jornalistas específicos. O não-reconhecimento deve ser o último recurso, e ainda assim apenas mediante provas de que a empresa está sendo tratada de forma injusta.
No caso de mensagens mistas, o melhor a fazer é tentar compreender as duas faces do relato. Quando a cobertura da mídia apresenta tanto atributos positivos como negativos, pode sugerir que a empresa envia mensagens pouco claras ou que a mídia tem opiniões distintas sobre um mesmo assunto. Nesse caso, embora a tendência natural seja intensificar os aspectos positivos, os executivos devem se esforçar para compreender primeiro os aspectos negativos. Se um grande esforço ambiental, por exemplo, não se ref lete nas análises feitas na cobertura da mídia, é possível que o problema esteja na falta de sustentação da iniciativa pelos produtos e serviços da empresa.
É preciso considerar se a ausência de um tema na mídia tem realmente importância. Por exemplo: para os principais stakeholders, a falta de atenção da mídia para as atividades ambientais da empresa importa? Embora a responsabilidade social das empresas seja um assunto que ganha cada vez mais importância em muitos meios, em geral não suscita o mesmo interesse entre os consumidores, a não ser quando é possível identificar diretamente a melhora dos produtos e serviços.
De uma perspectiva corporativa, em suma, não é possível compreender o mundo dos negócios sem conhecer a influência da mídia sobre o que as pessoas pensam a respeito de uma empresa e seus concorrentes. No entanto, é fundamental que os executivos avaliem com mais detalhe e mais profundidade o que a imprensa fala sobre suas organizações. Assim, terão condições de tomar decisões bem informados e, em conseqüência, melhorar sua reputação.