União, coragem, responsabilidade e uma formação sólida são os requisitos para que as chamadas ecomídias cumpram o seu papel.
Tem sido consenso em todas as discussões sobre sustentabilidade que a informação socioambiental é indispensável para a valorização deste conceito na sociedade. Apesar do crescente número de publicações dedicadas à cobertura do tema, a falta de dinheiro não é nenhuma novidade para esses veículos tidos como “alternativos”. Ficou claro nos debates realizados no Centro de Convenções Frei Caneca, na semana passada em São Paulo, que fazer jornalismo de forma competente e de qualidade custa caro e que ninguém quer pagar essa conta.
Com o advento da internet os leitores também estão pagando cada vez menos pela informação. No caso das empresas ditas socioambientalmente responsáveis, que concentram a verba publicitária que poderia financiar essa informação, a preferência é pelos veículos já consolidados, cujas pautas nada trazem de novo, além de promoverem a manutenção do establishment, do status quo e o incentivo ao consumo. “O problema é que quem direciona essa verba são as agências de publicidade, que não levam vantagem nenhuma em distribuir esses recursos em pequenos veículos, pois elas ganham dinheiro negociando bônus com volume de repetição de anúncios na grande mídia. Quanto mais anunciam, mais bônus elas ganham”, explica o ex-publicitário Rogério Ruschel, reforçado pelo editor da Revista do Meio Ambiente, Vilmar Berna, que desabafa: “O critério do publicitário para escolher onde anunciar é o custo por mil [leitores]. Não podemos competir”.
Na opinião de Berna, e é aí que entra a Ecomídias, formada e apoiada por alguns dos principais veículos socioambientais do país*. “A Ecomídias não é uma mídia nova, é uma associação entre elas para conseguir coisas que sozinhas não conseguem”, explica. Sugere, por exemplo, a formação de um pool de veículos, o que daria o volume necessário para atrair a atenção das agências de publicidade na hora de anunciar. “Imaginem que, na hora de oferecer espaço na minha revista, o anunciante também possa anunciar em mais três ou quatro veículos? Não seria mais fácil?”, provoca Vilmar.
“Espero que os companheiros se sensibilizem para se unir em torno dessa ideia”, pondera. Outra função da Ecomídias é lutar por políticas públicas que contemplem a comunicação socioambiental. Quando foi criada, há dez anos, a Ecomídias conseguiu criar junto ao Ministério do Meio Ambiente um Grupo de Trabalho com esse fim. “Mas, talvez por inabilidade política do grupo na época, perdemos espaço para as ONGs e o GT não desenvolveu o seu trabalho”, lamenta.
Ele lembra que boa parte dos rendimentos publicitários dos grandes veículos de comunicação do país provêm de empresas públicas, como Petrobras, Banco do Brasil, Correios e Nossa Caixa. Em sua opinião, o dinheiro público deve ser usado também para patrocinar esse tipo de informação, “a informação que a sociedade precisa e não somente a que ela quer e que enche as bancas de jornais”.
Ruschel, pioneiro no conceito de “marketing verde” no Brasil, observa também que a mídia socioambiental sofre pela falta de profissionalização na sua tentativa de conquistar um pedaço do mercado. “Não se vende só porque é simpático, não adiantam argumentos emocionais na hora da venda, não basta mostrar a importância desse tipo de informação, dizer que é um serviço que está sendo prestado para a sociedade. É preciso ser racional, apresentar pesquisas de mercado, números satisfatórios, o prestígio da publicação, etc. A maioria não tem uma pessoa de mercado à frente das vendas, que entenda como funciona, que circule no meio, que conheça as pessoas, as agências e que faça o veículo ser conhecido. Geralmente quem faz esse trabalho é o próprio publisher, que é um jornalista”, critica.
Coragem e responsabilidade
Além das dificuldades financeiras, Gladis Éboli, diretora de comunicação do Instituto Ethos e uma das palestrantes do evento, destaca o papel dos profissionais de marketing e publicidade, que, em sua visão, precisam ter coragem e responsabilidade. “O marketing tem o poder de influenciar o comportamento da empresa e do consumidor. Ele é responsável por mudar o comportamento desses atores e também das agências de publicidade, que por sua vez também tem de ter coragem para questionar o cliente sobre o que e como estão anunciando”, afirma. Ela lembra que o termo “sustentável” foi banalizado. “Todo mundo acha que entende o que é sustentabilidade. Para que o consumidor não fique confuso e até mesmo cético, é preciso que a comunicação seja bem-feita”, diz Gladis.
Para a diretora do Ethos, a sustentabilidade pode estar só na marca ou no discurso da empresa, o conhecido greenwashing. Para ilustrar, ela conta que em 2007, quando era responsável pela comunicação do Greenpeace, a ong ambiental ganhou o primeiro prêmio Top of Mind do jornal Folha de S. Paulo, empatada com a marca Ipê, de detergente. “O motivo é que eles anunciam que plantam árvores e que o detergente é biodegradável”, espanta-se Gladis.
Um dos principais fatores que influenciam no baixo nível de qualidade da comunicação de temas da sustentabilidade, feita atualmente, é a formação do profissional, desde a universidade. Em sua palestra, o professor do Instituto Mauá e das faculdades Metodista e Braz Cubas, Baker Ribeiro, lembra que a “geração do futuro”, descrita no relatório Brundtland, em 1987, está ingressando no ensino superior hoje. “O que mudou de lá pra cá? Nada. É papel das universidades educar esses jovens quase adultos, mas poucas dedicam espaço para isso”, lamenta. Baker lembra a pesquisa encomendada pela emissora de televisão MTV, cujos resultados mostram que mais de 40% dos jovens nunca sequer ouviram falar em sustentabilidade. “Como é possível quebrar o paradigma de uma agência de publicidade, que só estimula o consumo, se lá atrás, na formação acadêmica desse jovem, ele não tem referências, alternativas, não é apresentado ao tema?” critica.
Baker encerrou lembrando a importância da comunicação na sociedade, seja através do jornalismo, marketing, relações públicas ou publicidade: “Comunicar é transformar. Se todas as profissões, como medicina, engenharia, advocacia etc. têm seu papel notadamente relevante, o comunicador tem de saber que ele é um dos principais fatores de transformação, que ele afeta diretamente o modo de vida das pessoas com o seu trabalho, seja em uma empresa ou para o público em geral”, conclui.
* Fazem parte do Ecomídias as revistas Horizonte Geográfico, Terra da Gente, Plurale, ComCiência Ambiental, Sustenta, ECO 21, Business do Bem, Meio Ambiente Industrial, Revista do Meio Ambiente, JB Ecológico, Ecológico Minas e Ideia Socioambiental; os sites Envolverde, Mercado Ético, CarbonoBrasil, Água Online e EcoAgência; rádio Eldorado; Agência Inter Press Service e Projeto Terramérica; e Rede Brasileira de Informação Ambiental. (Envolverde)
Wilson Bispo (Envolverde) especial para o Instituto Ethos